A vida se maquia. Finge ser longa, passar devagar, ser um acúmulo de fatos, alí, concentrados como a borra de café.
Enquanto isso eu finjo que acredito nela. Eu finjo sentir tédio, finjo querer que ela se acelere.
Eu converso com o tempo, dissimulo, quando na verdade ele é o único confiável entre todos. Só confio no tempo. E mesmo assim, minto pra ele. Peço que ele corra, avance, me dê uma carona para que eu chegue mais rápido ao que desejo.
O tempo é bom comigo. Mas eu aprendi a ser uma atriz, maquiada de vermelho, como a vida.
Sou aquela que se solta do corpo, deita na água fingindo acreditar que é uma maré vermelha, mas ciente de que há correnteza, e ela me carrega.
Meus senhores, não confiem em mim.
B.
abril 28, 2011
abril 15, 2011
Bilhete à Mamãe
Bom dia, Mamãe,
A essas horas estou longe.
Deixei meu celular sobre a cama
Deixei aberto o meu quarto
Bebi teu licor
Eu limpei minha vida
Fiz um tipo de aborto
Joguei a cópia da chave por debaixo da porta, que é pra não ter motivo de pensar numa volta
A culpa não é sua, nem minha. Somos assim.
Boa sorte,
Adeus.
B.
A essas horas estou longe.
Deixei meu celular sobre a cama
Deixei aberto o meu quarto
Bebi teu licor
Eu limpei minha vida
Fiz um tipo de aborto
Joguei a cópia da chave por debaixo da porta, que é pra não ter motivo de pensar numa volta
A culpa não é sua, nem minha. Somos assim.
Boa sorte,
Adeus.
B.
abril 07, 2011
E 'flash'
Eu queria ter talento para ser uma atriz. Porque atores podem parar de atuar longe das cameras, ou fora dos palcos. Modelos não.
Até agora passei a maior parte da minha vida adulta parada num cenário por um punhado de dólares a hora, exibindo roupas e sapatos, com o cabelo penteado.
Enquanto isso, algum fotógrafo me dizia o que eu devia sentir.
Ele gritando: - Quero luxúria, Gata!
E flash.
- Quero malícia.
E flash.
-Quero expressão dramática, olhos misteriosos, boca selvagem, e intelectualismo.
E flash.
Nunca somos quem realmente somos. Nunca serei eu. Longe dos ensaios fotográficos tenho que fazer o que mandam também: Me mandam ser magra e bem vestida, sempre.
Nunca comer. Se comer um bolo, vomitá-lo. Manter as medidas ou diminuí-las. Estar sempre cheirando a Chanel nº 5. E conhecer todas as pessoas importantes do mundinho medíocre da moda.
Sabia que as modelos brasileiras sofrem bem mais porque o padrão da mulher brasileira é ter o quadril maior?
E quando a gente dá entrevista falando que come chocolate, é mentira, porque não podemos mesmo!
Então, quando a gente aprende a passar fome, aprende que nos dias de hoje sua beleza importa mais que sua saúde.
Afinal, é minha beleza que me mantém viva. Minha fome que me dá punhados de dólares.
Texto escrito para interpretação de Karina Soares à Semana Cultural Escola Técnica de São Roque.
Baseado em Monstros invísiveis.
Colaborado por André Vaz.
B.
Até agora passei a maior parte da minha vida adulta parada num cenário por um punhado de dólares a hora, exibindo roupas e sapatos, com o cabelo penteado.
Enquanto isso, algum fotógrafo me dizia o que eu devia sentir.
Ele gritando: - Quero luxúria, Gata!
E flash.
- Quero malícia.
E flash.
-Quero expressão dramática, olhos misteriosos, boca selvagem, e intelectualismo.
E flash.
Nunca somos quem realmente somos. Nunca serei eu. Longe dos ensaios fotográficos tenho que fazer o que mandam também: Me mandam ser magra e bem vestida, sempre.
Nunca comer. Se comer um bolo, vomitá-lo. Manter as medidas ou diminuí-las. Estar sempre cheirando a Chanel nº 5. E conhecer todas as pessoas importantes do mundinho medíocre da moda.
Sabia que as modelos brasileiras sofrem bem mais porque o padrão da mulher brasileira é ter o quadril maior?
E quando a gente dá entrevista falando que come chocolate, é mentira, porque não podemos mesmo!
Então, quando a gente aprende a passar fome, aprende que nos dias de hoje sua beleza importa mais que sua saúde.
Afinal, é minha beleza que me mantém viva. Minha fome que me dá punhados de dólares.
Texto escrito para interpretação de Karina Soares à Semana Cultural Escola Técnica de São Roque.
Baseado em Monstros invísiveis.
Colaborado por André Vaz.
B.
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